LÚCIA
GASPAR
BIBLIOTECÁRIA DA
FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO
Sendo
originário da Idade da Pedra ou do período Neolítco, o carro de boi surgiu no
Brasil com os primeiros engenhos de açúcar, na época da colonização portuguesa.
Foi um
dos primeiros instrumentos de trabalho, além do mais antigo e principal veículo
de transporte utilizado no País, principalmente nas áreas rurais, por quase
três séculos.
O carro
é composto por duas
rodas, um grade ou mesa de madeira e
umeixo. As rodas
são feitas de madeira de boa qualidade, com um anel de ferro de forma circular
nas extremidades, para garantir maior resistência. Primitivamente, o carro não
era ferrado e as pessoas diziam que “o carro andava na madeira”. A grade possui
cerca de três metros de comprimento por um e meio de largura, com duas peças
mais resistentes de cada lado e uma terceira no meio, mais comprida, destinada
a atrelar o carro à canga,
uma peça, também de madeira, com mais ou menos um metro de comprimento,
contendo um corte anatômico para assentar bem no pescoço do boi, sendo segura
por uma correia de couro chamada de brocha. A
grade é apoiada sobre um eixo. O ponto de apoio da grade sobre o eixo são duas
peças de madeira chamadas cocão. O
chiado ou cantiga característica do carro de boi é produzido pelo atrito do
cocão sobre o eixo.
As
madeiras utilizadas na construção dos carros de boi tinham que ser fortes,
principalmente as das rodas. As mais usadas eram o pau d`arco, aaroeira, a sucupira, a carnaubeira.
O carro
de boi pode ser puxado por uma, duas ou mais juntas ou parelhas. Cada junta possui
dois bois, que trabalham um ao lado do outro, unidos pelacanga.
Nos
terrenos mais planos e em trabalhos mais leves utiliza-se, normalmente,
uma parelha e
nos mais pesados, desenvolvidos em terrenos mais acidentados, duas ou mais, uma
atrás da outra. As parelhas são conjugadas por uma corrente que liga as cangas.
Nos
engenhos, durante o verão, época da moagem, o boi era atrelado ao carro para
transportar a cana e o açúcar e, no inverno, ao arado para revolver e cavar a
terra destinada ao plantio da cana-de-açúcar.
O
condutor do carro que comanda os bois é chamado de carreiro. Normalmente,
utiliza uma vara fina, com mais ou menos três metros de comprimento, contendo
uma ponta de ferro para ferroar o animal, castigando-o ou indicando a direção a
ser seguida. Usa também um chapéu
de couro, umpeitoral e
um facão,
colocado numa bainha de couro pendurado no cinto.
Os bois
se acostumam de tal forma com o carreiro que,
muitas vezes a um simples chamado dele, se dirigem vagarosamente e ficam
parados próximo ao local onde são normalmente encangados. Batizados com nomes
pitorescos, como Cara
Preta, Presidente, Azulão, Lavareda, Malhado, Pachola, Curió,
atendem pelo nome ao chamado do carreiro.
No início
o linguajar do carreiro,
elemento fundamental para a manobra dos carros de boi, não passava de sons
gaguejados como “ôu!”... para
parar os bois ou “êi!”... para
fazê-los descer ladeiras. Evoluiu depois para frases e expressões tipo “Vamos embora!” e “Volta boi Azulão!”
“Carrega boi Malhado!” O carreirodirigia-se ao animal
específico que queria comandar, sendo seus gritos reconhecidos e atendidos.
Além de
ajudar no transporte de cana, açúcar e lenha nos engenhos, o carro de boi
servia para transportar mudanças e conduzir pessoas. Havia tambem uma versão
coberta. Foi utilizado como carruagem para a nobreza rural brasileira; como
transporte de bandas de música das cidades para o interior e
vice-versa; para levar as famílias sertanejas às festas de Natal e Ano
Novo, quando eram todos enfeitados para a missão e, ainda, nas campanhas
políticas, servindo de elemento de aproximação entre eleitores e candidatos.
Nos
anos de 1939 a 1945, durante a Segunda Guerra Mundial, devido à
falta combustível para caminhões e automóveis, o carro de boi voltou a
aparecer, por algum tempo em certas regiões do País ajudando a transportar
cargas e pessoas.
Atualmente,
em Goiás, é utilizado pelos romeiros que vão da cidade de Damolândia para o
Santuário do Divino Pai Eterno, no município de Trindade (a cerca de 74km de
distância) para participar da Festa de Trindade, que acontece no final do mês
de junho e início de julho. Os carros são enfeitados e participam de um desfile
que é muito concorrido e apreciado pelos participantes da festa.
Na
história do Brasil, o carro de boi aparece na Colônia, no Império, na
República, na Revolução de 1930, no Estado Novo. Pode apresentar variações de
“modelos” e nomes: carro, carroça ou carreta, como no Rio Grande do Sul, porém,
nenhuma cidade, vila, povoação, fazenda, sítio, do litoral ao sertão ignora a
existência deste rústico e primitivo meio de transporte, que ajudou a fazer a
história do Brasil.
FONTE
– FUNDAÇÃO JOAQUIM NABUCO